Tudo bem, é caro transportar produtos de fora para cá, o que pode justificar parte dessa diferença. Mas não dá para colocar só na conta dos custos de transporte e distribuição uma disparidade absurda como essa.
Impostos de importação são bastante elevados por aqui, o que certamente explica em parte nosso baixo grau de abertura. Mas não é só isso. Há uma burocracia pesada para desembaraçar produtos, o que os encarece e provoca atrasos nas entregas.
Outro ponto que atrapalha demais e não pode ser descartado: a baixa qualidade de nossa infraestrutura de portos e aeroportos. Ela contribui, como os demais fatores, para desestimular a importação, reduzir a competição e puxar os preços para cima.
O Brasil é mais fechado que outros países
Vemos, entretanto, alguns políticos, economistas e gestores argumentando que a economia brasileira não é fechada ao comércio internacional. Por exemplo, em setembro de 2016, o então ministro das Relações Exteriores José Serra definiu como “folclore” a ideia de a economia brasileira ser fechada. Ele disse que nosso comércio não era mais fechado que o da média dos países, que, segundo afirmou, vivem protegendo seus mercados internos da competição externa.
Será? Que tal darmos uma olhada nos dados?
Uma medida comum da exposição de um país ao comércio é a soma de exportações e importações dividida pelo valor do PIB. A divisão pelo PIB é feita para eliminar o efeito da escala, já que países maiores acabam exportando e importando mais.
O gráfico a seguir mostra esse indicador para 166 países. Os dados são do Banco Mundial e dizem respeito ao ano de 2021. Cada barra é um país, e eles estão ordenados de forma decrescente. A linha horizontal mostra a média mundial do indicador (ponderada pelo PIB de cada país).
O Brasil está entre os países mais para o final do ranking:
Em 2021, nosso volume de comércio como proporção do PIB foi igual a 39,2%. Está abaixo da média mundial, que gira em torno de 56%.
Brasil é fechado por ser muito grande?
Há um problema, é verdade, em olhar de maneira crua para esse indicador: ele tende a ser mecanicamente mais baixo para países grandes como o Brasil. Isso porque países maiores fazem muito comércio interno, o que acaba substituindo o comércio com o exterior.
Para observar isso com maior clareza, sugerimos um exercício hipotético: suponha que a Europa se torne um único país. Todos os fluxos de comércio entre os países europeus deixariam de ser classificados como comércio internacional para se tornarem comércio interno desse novo país. A fração dos fluxos de comércio internacional no PIB, consequentemente, seria menor.
Essa relação entre o tamanho do país e o comércio é evidente nos dados. O gráfico abaixo mostra a relação entre o volume de comércio dos diversos países (eixo vertical) e seu tamanho, medido pela população (eixo horizontal). Cada ponto representa um país. A linha diagonal é a reta que melhor se aproxima da nuvem de pontos.
Quando estimamos a linha diagonal, permitimos que a média do comércio dependa da população. Repare: essa linha é descendente, isto é, países com população maior tendem a apresentar valores menores de comércio como proporção do PIB. Para saber se um país está acima ou abaixo da média nesse caso, analisamos sua posição na nuvem de pontos relativamente à linha diagonal. Note que o Brasil está abaixo dela. Ou seja, mesmo depois de levar em conta o efeito da população do país, podemos manter a conclusão de que o Brasil faz menos comércio do que a média.
Caso encerrado?
Ainda não. Pode-se argumentar que o Brasil comercializa pouco por estar longe dos principais centros consumidores do mundo — como Estados Unidos, União Europeia, Japão e China. O baixo comércio resultaria de fatores geográficos, não de políticas que dificultam a abertura internacional.
Para avaliar se esse raciocínio faz sentido, podemos observar como o indicador de comércio se comporta ao longo do tempo em comparação com o mundo. A geografia, afinal, não muda com o passar do tempo — não dá para alterar a posição do Brasil no globo terrestre.
No próximo gráfico, temos o comércio como proporção do PIB do Brasil e do mundo, avaliado anualmente entre 1972 e 2021. Como se vê, a diferença entre o nosso comércio e o do mundo está diminuindo, mas ainda é grande. Não há como atribuir esse fato à distância do Brasil em relação a grandes centros consumidores — afinal, essa distância não muda com o tempo.
A explicação mais plausível: a economia brasileira, conhecida por limitar importações, ainda continuou relativamente fechada ao longo dos anos.
Sim, é certo que há políticas protecionistas em todo canto do mundo. Mas não dá para dizer que o Brasil é tão fechado quanto a média dos países.
Reproduzido e adaptado sob autorização da editora Companhia das Letras e do autor.
Celulares e PCs são caros porque o Brasil é muito fechado – eis o que isso significa
You must be logged in to post a comment.