A expectativa, naturalmente, é que os investimentos em inteligência artificial generativa se paguem no futuro. As empresas trabalham para que suas soluções se tornem dominantes, mesmo que em segmentos específicos, resultando em novas fontes de receita.
Mas isso não está acontecendo ainda. No início de fevereiro, após a divulgação dos resultados financeiros do último trimestre de 2023, Google e Microsoft viram o valor de suas ações caindo. Motivo: investidores esperavam que o negócio de IA já estivesse dando frutos após tanto dinheiro injetado na área.
A desvalorização não foi significativa, mas mostra que as expectativas em torno da nova tecnologia são altas. E que lucrar em cima de IA pode ser tão complexo quanto desenvolvê-la.
Queimando caixa para garantir usuários
Existe um motivo pelo qual a pesquisa e desenvolvimento de inteligência artificial generativa está nas mãos das Big Techs: só empresas desse porte conseguem bancar o custo de criar e manter tais sistemas.
Claro que startups como OpenAI e Anthropic trouxeram avanços para a área, mas essas empresas menores recebem altos investimentos de players como Microsoft, Google e Amazon. Tudo volta para elas.
Especula-se que o acordo entre Microsoft e OpenAI gire em torno de US$ 13 bilhões. A startup se beneficia do poder computacional da Big Tech, com sua sólida estrutura de computação em nuvem, para treinamento de suas IAs e desenvolvimento de produtos. Google e Anthropic têm uma relação semelhante.
Em troca, as Big Techs obtém acesso aos produtos desenvolvidos pelas startups, e vão, é claro, tentar monetizá-los ao máximo. A questão é que, na etapa em que estamos, é difícil garantir quais produtos de IA vão se mostrar significativamente lucrativos.
Como discutimos no Tecnocast 325, o atual momento é uma corrida em busca do famoso “winner takes all”. A estratégia, conhecida no Vale do Silício, é tentar expandir ao máximo a base de usuários, mesmo que isso exija uma constante queima de caixa. Daí os novos recursos e ferramentas de IA que aparecem todos os dias.
A expectativa é que, com os usuários assegurados, a empresa encontre uma maneira de monetizá-los. Em outras palavras, o retorno financeiro é uma preocupação posterior.
A questão é que, na opinião de uma fatia dos investidores, já era hora dessa segunda etapa estar em curso. Ou pelo menos de uma perspectiva mais clara de como trazer lucro real ao setor. Pelo visto, terão de aguardar um pouco mais.
Até porque outros custos podem estar chegando.
Pague pelos dados
Treinar modelos de linguagem cada vez melhores exige uma insana quantidade de dados. São textos, imagens e vídeos criados por humanos — e muitos deles não estão nada contentes com isso.
Processos contra empresas de IA por uso indevido de material para treinamento de seus sistemas se acumulam desde o ano passado. Os mais recentes envolve escritores contra OpenAI e Meta, incluindo nomes como George R. R. Martin, e um processo movido pelo jornal New York Times contra a dona do ChatGPT.
Em jogo nesses casos está o método de obtenção de material para treinamento de modelos de linguagem. Tudo que está na internet pode ser usado indiscriminadamente para criar ferramentas capazes — em tese — de gerar bilhões de dólares? E quanto a materiais protegidos por copyright, os autores deveriam ser pagos?
Se decisões desfavoráveis às grandes empresas ocorrerem, é mais dinheiro que precisarão desembolsar. Mais um custo acrescentado aos vários já existentes.
Vale lembrar também que diversos sites de grande expressão bloquearam o robô da OpenAI, diminuindo a quantidade de conteúdo de qualidade para treinamento de IAs. A tendência é que o acesso a esses textos esteja cada vez mais sujeito à remuneração.
É isso que está por trás do acordo entre Google e Reddit. Depois de bater o pé contra empresas que raspavam dados da plataforma para treinamento de IA, a rede social sinaliza que basta abrir a carteira e a conversa muda de figura.
A Apple, que ainda não se lançou no universo da IA, mas trabalha para isso, também estaria pagando veículos de imprensa para obtenção de dados para treinamento.
Em resumo, é mais uma despesa em meio a tantas outras no desenvolvimento de IA. Não é à toa que retorno financeiro está demorando.
Três dígitos de lucro
Mas não é verdade que ninguém está lucrando, e bem, com inteligência artificial. A Nvidia, por exemplo, não tem do que reclamar.
Só no último trimestre, a receita da empresa cresceu 265% em relação ao anterior. O aumento nos lucros é ainda mais chamativo: nada menos que 769%, totalizando US$ 12,3 bilhões.
A Nvidia é a principal fornecedora de chips utilizados no treinamento de sistemas de inteligência artificial. Entre 70% e 90% do desse mercado pertence à empresa — domínio absoluto, portanto.
Os números da Nvidia evidenciam que o setor está, de fato, muito aquecido. A bagagem da empresa como produtora de GPUs já a posicionava muito bem para alimentar as ferramentas que vinham surgindo, e a dianteira lhe dá ainda mais vantagem agora que soluções totalmente pensadas para IA vão se tornando mais necessárias.
Empresas enxergam oportunidades na IA generativa, e querem sua fatia da torta. Não está claro quando conseguirão. Os custos atuais são altos, e novos podem surgir. Para quem quer ser um grande player no setor de inteligência artificial, o caminho ainda é incerto.
Enquanto isso, a Nvidia segue como um grande termômetro do mercado: prova de que todos estão em busca de ouro, mas que se dá melhor mesmo é quem vende as pás.
Quem disse que ia ser fácil ganhar dinheiro com IA?
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