As identidades secretas é algo que acompanha os super-heróis desde as primeiras edições de Batman e Superman, lá nos anos 1930. Inicialmente era apenas uma forma de brincar com o imaginário dos leitores, de forma que qualquer um pudesse “trocar de traje” convencional para um que o levasse a aventuras espetaculares. Atualmente a DC já nem liga de mostrar a perturbação mental do Homem-Morcego, que chegou a um patamar de “doidera controlada” deixando-o deixa são — bem, pelo menos na maior parte do tempo.

O recurso do alter-ego ganhou bastante complexidade ao longo dos anos e, atualmente, é até mesmo um tema controverso nos quadrinhos. Pode ser interpretado de maneira perturbadora quando a análise sobre a saúde mental dos personagens é contextualizado em um ambiente real. Há quem acredite que seja um fetiche, indícios de transtornos, válvula de escape para um mundo de fantasia; outros veem como dupla personalidade problemática.

Na verdade, pode ser tudo isso e outras coisas, afinal, essas possibilidades em trama bem construídas é que fazem os heróis serem mais complexos e intrigantes. Só que, claro, para que as pessoas entendam melhor as motivações e comportamentos, as editoras mantêm uma personalidade mais clara e simples, sem levar tanto a sério algo que poderia tornar as aventuras desses superseres em um constante transtorno.


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E, para destacar como Batman tem uma orientação diferente e até assustadora, a DC Comics admite que Bruce Wayne é uma pessoa mentalmente desequilibrada. Além do trauma com a morte dos pais, o herói costuma mergulhar na mente dos criminosos mais insanos, e é o único da Liga da Justiça que consegue fazer isso sem se corromper por completo. 

Coloque aí na conta mental de Bruce o fato de as pancadas na cabeça que recebeu ao longo de sua carreira de combate ao crime, associadas a uma rara noite completa de sono, causaram recentemente um problema enorme envolvendo uma personalidade “reserva” dentro de sua própria mente, o Batman de Zur-En-Arrh. 

O Batman de Tom King foi um dos que mais refletiram sobre sua própria perturbação mental (Imagem: Reprodução/DC Comics)

Para completar, atualmente a DC nem cita mais a morte dos Wayne, muito menos repete aquela cena clássica. A morte dos pais não é mais associada à sua missão de combate ao crime há bastante tempo — afinal, se órfãos do mundo todo, muitos sem recursos e em situações muito mais graves,  conseguem superar, por que Bruce não conseguiria, certo? O Homem-Morcego, depois de espancar vários detentos em um presídio, confessou há alguns anos que nem lembra mais do assassinato dos familiares faz tempo. Apenas admitiu que caça criminosos simplesmente pelo prazer de espancá-los enquanto salva vidas.

Acontece que parte do charme do personagem e da paixão dos leitores está justamente nisso: Batman tem várias limitações e problemas que muitas pessoas têm no mundo todo. Sua luta diária para manter a mente sã e seu código moral e ético alinhado com o que significa transformar vingança em Justiça talvez sejam seus maiores desafios em cada jornada.

Por que Bruce chocou a sociedade?

Bem, depois que a DC Comics parou de tentar evitar críticas sobre os problemas mentais de Batman, ela finalmente definiu o personagem de maneira que ele se torna um enigma para qualquer psiquiatra. Isso aconteceu durante a fase Renascimento, em que a editora tinha acabado de desfazer a as mudanças patéticas do reboot Novos 52 para reposicionar seus ícones.

Em Wonder Woman Annual #1, lançado em 2016, há um momento tocante de puro companheirismo entre os heróis da Trindade DC, Batman, Superman e Mulher-Maravilha. Um dos contos do volume mostra como foi a primeira vez que eles revelaram suas identidades secretas, e, de quebra, quem eles realmente são por dentro.

Para isso, Diana Prince pediu para que todos tocassem seu Laço da Verdade e revelassem as personas que fazem parte de suas vidas duplas. A Mulher-Maravilha não se vê exatamente como uma heroína ou uma guerreira. Ela responde que é “Diana de Themyscira, filha da Rainha Hippolyta”. Ou seja, em seu íntimo, ela se vê como uma devota cidadã de sua comunidade, assim como um membro da nobreza na condição de princesa.

Já o Superman não “troca” exatamente de persona, apenas aceita que ele possui três que o completam de forma que não precisa esconder ou sofrer para manter posturas diferentes. O contexto e as pessoas ao redor é que o veem de acordo com sua função e relacionamento em ambientes e comunidades distintas. Assim, ele responde alegremente que é “Clark Kent e Kal-El” — note que ele não se vê como um “super-homem”, afinal, ele se autodenominar assim nem combinaria com sua humildade e simplicidade da roça.

Batman não se sente Bruce Wayne, ele simplesmente é Batman (Imagem: Reprodução/DC Comics)

Batman simplesmente diz que ele é “Batman”, para o espanto dos colegas que tinha acabado de conhecer. Embora tenha que desempenhar seu papel como civil para fazer outras tarefas que não exijam espancar bandidos, mesmo quando está sem traje com a identidade coberta, Bruce não deixa de agir como o Homem-Morcego. Da mesma forma como ele pode manipular as pessoas e se mesclar às sombras e ao medo para caçar bandidos, ele também apenas faz o mesmo quando é necessário parecer apenas um bilionário entediado.

Batman precisa de Bruce

O fato de o Cavaleiro das Trevas se ver como Batman, na verdade, é Bruce aceitando que ele não tem uma vida separada ou um alter-ego, muito menos dupla personalidade. Para ele, admitir que seu lado de playboy bilionário não existe mais faz tempo não quer dizer exatamente que ele perdeu a sanidade ou a humanidade.

Pelo contrário. Admitir que em sua mente não há dúvidas sobre quem ele seja é o que dá o foco para que ele tenha certeza de que não seja psicótico. Isso fica claro em um episódio da animação Batman Beyond exibido em 1999. Em certo momento da trama, Bruce Wayne e seu pupilo, o Batman do Futuro Terry McGinnis investigam vozes misteriosas que aparecem chamando o Homem-Morcego da “Velha Guarda”.

 

O sempre sarcástico McGinnis adora provocar Bruce, e pergunta: “Como você tem certeza de que essas vozes não vêm se sua própria mente?”. Eis que Batman responde: “Primeiro porque eu não sou psicótico. Segundo, não me refiro a mim mesmo como Bruce”. “Como você se refere?”, cutuca novamente o jovem, que recebe de volta um olhar de “soco na boca”. Outro que fica chocado ao ver quem Bruce realmente é. 

De qualquer forma, por experiência própria e por observação sobre outras versões suas no Multiverso, Batman sabe que precisa de Bruce, pelo simples fato de que é uma maneira de ele viver com qualquer outra pessoa de dia. Seja indo no mercado, beijando alguém no boteco, dormindo desbeiçado na cama ou tomando uma sopa enviando meme para o Superman, esse lado bocejante de sua vida é o que ainda mantém sua mente coesa.

Por enquanto, né.

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